Entrevista com Ju Dantas sobre eventos, festivais e o cenário de mudanças climáticas

Entrevista com Ju Dantas sobre eventos, festivais e o cenário de mudanças climáticas. Imagem: Dataísmo.

Esse é um projeto de entrevistas feitas com profissionais e pesquisadores de comunicação, consumo e dados. São sete perguntas para entender temas relevantes e atuais do mercado.

Conheça a entrevistada

Ju Dantas é produtora, com mais de 13 anos de experiência na execução e operação. Já realizou eventos, turnês, projetos artísticos e culturais. Atuou nacional e internacionalmente em diversas frentes de projetos do setor das artes, cultura e entretenimento. Seu portfólio inclui a produção de broadcasting na Copa do Mundo FIFA 2014, nos Jogos Rio 2016 e na produção dos festivais MADA, Spotted, Burburinho, Garage Sounds e Let’s Pipa. Como promotora de eventos em casas noturnas, em 2017 ganhou o prêmio de “maior faturamento do ano” no Ateliê Bar Natal (RN). Em 2019, foi a técnica responsável pela campanha de Prevenção de Acidentes do SEST/SENAT que, por meio de ações socioeducativas, impactou mais de sete mil trabalhadores dos transportes e seus familiares. Também idealizou, escreveu e executou diversos projetos artísticos. Bacharel em Comunicação pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) e certificada em Inovação pelo SEBRAE (RN), já realizou diversos cursos sobre Design de Experiência, User Research, Experience Mapping, Metodologias Ágeis e outras formações que dão suporte ao seu trabalho.

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7 perguntas para Ju Dantas

1. Como você entrou no universo dos eventos?

Cresci num cenário midiático comum na infância dos anos 90: muita TV, rádio, revistas, discos, fitas e CDs no dia a dia da casa. Aí veio o fanatismo por Xuxa, depois por Sandy & Júnior, Spice Girls, Britney, junto com a MTV… Depois veio o computador, a internet, e eu cada vez mais apaixonada e envolvida por música e artistas em geral. Minha mãe me levou ao Machadinho (estádio do RN) para assistir Sandy e Junior, e me lembro até hoje do encantamento que tive com o ginásio lotado.

Decidi que faria uma faculdade que me permitisse trabalhar com mídia e artistas que nela habitavam, e então fui para o curso de Comunicação com habilitação em Rádio e TV. A princípio, o sonho era comum aos jovens dos anos 2000: trabalhar na MTV. Mas logo no segundo ano de curso, a MTV Brasil do jeito que a gente conhecia acabou. No entanto, meus planos eram estar por trás das câmeras, gravar videoclipes, produzir programas… era esse o lance.

Então, continuei aproveitando o curso, mas direcionei mais o foco dos meus estudos para a internet. Com isso, vieram oportunidades de contribuir com portais de música. Escrevi para o Lady Gaga Brasil e depois para o Portal Foca (RN), onde fiz coberturas de shows. Mais tarde, entrei para o Fuga Underground e comecei a fazer coberturas de festivais independentes como o Dosol. Nessas coberturas, percebi que queria estar na produção do evento, e aí começou minha história com shows e festivais.

Antes disso, tenho memórias de organizar eventos da igreja, de ficar enchendo os balões e cuidando da decoração, enquanto as senhorinhas da paróquia cuidavam da programação e do cronograma. Na rua onde cresci, na Zona Norte de Natal, nós organizamos aniversários, desfiles, apresentações cover… coisas do período pré-internet que me marcaram e, de certa forma, ajudaram a escolher minha profissão.

2. Como funciona a formação para ser um profissional de eventos?

Hoje, temos diversos cursos focados na área. Nas instituições federais, há cursos técnicos de eventos e superiores em produção cultural. Também existem várias escolas privadas com bons cursos, além de cursos gratuitos online que introduzem bem a área, como o curso do Rock in Rio, o Rock U, que é gratuito e considerado bem completo. Quem vem da Comunicação, Administração, Arquitetura e Engenharias se dá muito bem no setor.

Conhecimentos de administração (planos de trabalho, cronogramas, orçamentos…), boa leitura de mapas e esquemas organizacionais (para montagens de estruturas, organogramas, logística, etc.) e uma boa relação interpessoal (comunicação clara, equilíbrio emocional, resolutividade, relações públicas e etc.) são fundamentais para profissionais de eventos.

3. Que tipo de autorização um festival precisa ter, para acontecer?

Majoritariamente, são autorizações ligadas à estrutura e segurança do local do evento.

Na pré-produção, emitem-se os projetos de engenharia do palco e estrutura geral do evento, que precisam ser aprovados tanto pela engenharia do espaço locado quanto pelos bombeiros. Os bombeiros também realizam vistorias para a liberação do evento no dia, verificando todos os aspectos abordados no projeto de engenharia.

Quando o evento ocorre em espaço público, surgem as autorizações da prefeitura, do departamento de trânsito, da polícia militar e dos serviços de saúde e limpeza do município. A vistoria dos bombeiros, realizada sempre algumas horas antes da abertura dos portões, é que define se o evento abrirá as portas ou não.

4. Estamos vivendo um período de desconforto térmico, potencializado pelo aquecimento global e pelo El Niño. Você acha que isso exige novas precauções para eventos (considerando a estrutura que temos hoje)?

Sim, completamente!

Sei que o RiR nos anos 1990 mudou o período do evento justamente por causa das elevadas temperaturas no verão.

Recentemente, vi o Lollapalooza ter que parar a sua programação e afastar o público das grades para aguardar a tempestade passar, devido ao risco de choques na estrutura. Nosso país tropical é assim, e é exatamente por conta dessas adversidades que existe a pré-produção.

Imprevistos sempre acontecem, mas existem previsões que ajudam a antecipar problemas, e acredito que as previsões do tempo não devem ser desmerecidas, muito menos ignoradas, pois são dados, ciência, são fatos que dificilmente não se concretizam depois da previsão. Acho até importante a consultoria de um meteorologista, dependendo do período do evento e da situação climática nas semanas que antecedem o evento.

Claro, a hidratação do público é fundamental e deve ser uma medida de fácil acesso, de baixo custo, preferencialmente gratuita em eventos de todos os portes, principalmente os grandes e megaeventos em arenas, estádios e de rua.

Na era da experiência, é inadmissível que os clientes passem por necessidades básicas quando escolheram ir a um lugar para se entreter. O setor tem que se adaptar tão rápido quanto as mudanças climáticas, senão perde o sentido de existir.

5. Que dicas você daria para futuros festivais, considerando muito calor, chuva ou outros eventos climáticos?

Eu falaria para as organizações se adaptarem às previsões do tempo, buscando estar preparadas para os acontecimentos que já estão anunciados.

Se vai chover, disponibilizar capas de chuva de fácil acesso (baixo custo ou gratuitas). Se vai ter tempestade, não seria melhor adiar? Se há uma onda de calor, que tal colocar a programação do evento para a noite? Talvez uma medida que proíba as pessoas de formarem filas? Cadeiras marcadas? Eventos de grande porte têm condições de fechar o trânsito do entorno, permitindo o acesso aos estádios somente após o pôr do sol.

Sempre observar o material utilizado na estrutura, se será confortável para o público, materiais que evitem tropeços, quedas, queimaduras, choques, evitando fechamentos desnecessários que impeçam a circulação de ar.

Arborizar o espaço com plantas para trazer umidade e disponibilizar água gelada em abundância.

Participei de 8 edições do Festival MADA, entrei como “staff estagiária” e na última edição fui Head (como a gente chama os “cabeças”, os líderes, das equipes) da produção de camarins. No Let’s Pipa NYE Festival, vou para a 5ª edição no time artístico, que é a galera que fica à postos para atender todas as demandas da equipe artística enquanto estão na cidade para o evento até a partida para o novo destino.

Spotted é a maior calourada universitária do nordeste, acontece também na Arena das Dunas, onde colaboro há 9 anos (alguns anos com duas edições) no credenciamento geral.

Falando em Arena das Dunas, é um orgulho para mim dizer que dei o primeiro grande passo na minha trajetória na Copa do Mundo FIFA 2014 lá na Arena das Dunas, como estagiária de produção de broadcasting. Um trabalho muito desafiador, em outra língua, que demandou muita atenção, mas que, graças a esses desafios e às oportunidades que surgiram nele, fui chamada para as Olimpíadas Rio 2016 pela empresa de broadcasting responsável pelas imagens oficiais dos jogos.

Fui chamada para as Paralimpíadas, o evento mais legal que considero já ter participado até aqui, para assumir nesse caso a posição de liderança sob o cargo que tive nas Olimpíadas, que era uma espécie de relações públicas entre Evento-Emissora-Comitê, ficava nesse intermédio cuidando de solicitações de emissoras com relação a posicionamento no evento e tempo de entrevista com atletas.

Tem eventos marcantes como a micareta “Carnatal*”, que eu ia desde criança, e me senti muito realizada trabalhando lá por ser um evento que todo potiguar, de todas as gerações, conhece, e também festivais de eock onde tive a oportunidade de trabalhar com bandas que eu gostava de ouvir. Aí nem parece trabalho!

* Carnatal é o Carnaval fora de época em Natal, considerado um dos maiores carnavais fora de época do mundo.

7. Quais são os festivais mais inovadores do RN e do Brasil, em sua opinião?

Gosto muito de um festival que está congelado agora, o Garage Sounds. Idealizado em Fortaleza, o GS foi um festival que rodou muito pelo Nordeste nos anos 2017 e 2018 e pelo Brasil em 2019. Se não me engano, em cada cidade eram mais de 40 bandas, incluindo bandas mainstream, fazendo toda essa turnê pelo Brasil no ônibus do festival. Eles chamavam bastante bandas locais que preenchiam a programação, até as atrações principais. Em contrapartida, produziam videoclipes para essas bandas locais que, muitas vezes, não tinham um registro profissional ainda. O festival Garage Sounds, sem sombra de dúvidas, movimentou muito o cenário underground do Nordeste. Creio até que o inédito “I Wanna Be Tour”, que acontece no ano que vem aqui no Brasil, tem um pouco de inspiração no GS.

Amo a GGCON, uma convenção geek, gamer e de cultura pop que acontece no centro de convenções com muitas atividades simultâneas, é a nossa CCXP. E o Burburinho Festival de Artes, que são dois dias de um festival de artes integradas (teatro, dança, música…), com uma curadoria impecável desde as apresentações até a feirinha e praça de alimentação. É um festival para todas as idades apreciarem um bom momento num lugar impecavelmente pensado na experiência do público e em toda a sua jornada desde a entrada no evento.

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Profissional de Digital Business e Business Intelligence, com foco em Consumer Insights, Trends e Cultural Research. Pesquisa e trabalha criando estratégias baseadas em dados online e offline. Criadora do Dataísmo. Formada em Marketing e pós-graduanda em Digital Business na USP.

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